sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Arte excêntrica. pt.2

Li novamente o bilhete e naquele momento parecia que saira de mim por completo, vieram repentinamento à tona vagas lembranças do meu sonho.

Era um enorme corredor escuro,ouvia-se ruídos de ratos e de tábuas que rangiam a cada passo,as paredes tinham papel desgastado, sujo; ao fundo uma janela com vitral colorido onde permitira a passagem fosca de luz,um tanto turva. Esta luz tinha um ar misterioso e apesar de tímida, me atraia de forma natural,como um abutre é seduzido pelo cheiro de carne podre.

De certo não estava consciente, era uma força maior que me levara ao final do corredor onde havia uma porta entreaberta, minha curiosidade me fez espiar pela fresta ; foi quando vi uma jovem de avental branco e dois homens jovens caidos ao chão, me aproximei um pouco mais para entender a cena mas a moça de avental levantou a cabeça rapidamente em minha direção. Esta é a última coisa que me recordo.

Voltei a mim mas ainda não tinha total controle sob mim mesma, minha cabeça involuntariamente não parava de fazer perguntas - seria mesmo só um sonho?

(continua)

Arte excêntrica. pt.1

Acordei com o barulho das finas gotas de chuva resvalando sobre o parapeito,esta emitia um som baixo, suave, quase ritmado que acabara incomodando pela ausencia de variação em seu enredo.

Logo em seguida abri os olhos e me veio de imediato uma sensação de confusão,acabara de sair de um sonho onde certamente não havia estado em meu quarto, se quer em minha casa. Acompanhei os móveis vagarosamente com os olhos até meu cérebro associar que estava naquele momento de fato apenas em meu quarto, um lugar comum a minhas lembranças.

Não lembro ao certo o que havia visto no sonho que me fizera acordar tão perdida, recordo-me apenas de ter recebido na noite anterior uma ligação estranha que beirava meia noite.A voz que estava do outro lado da linha não era clara,só conseguia ouvir uma respiração ofegante, que pela rapidez com que oscilava parecia ser de alguém assustado ou nervoso.

Sentei-me na cama e passei a mão sobre meus olhos para que pudesse me livrar das remelas que tapavam a visão até o banheiro, um pouco zonza me posicionei em frente a pia, ainda de cabeça baixa espreguicei-me em uma tentativa vã de espantar a preguiça.Ao fim de outros rituais com intuito de despertar fui até a cozinha preparar um café forte, no caminho até a geladeira notei por debaixo da porta dos fundos um envelope branco, ele refletia diretamente em meus olhos a pouca luz do sol que conseguia sobressair por de trás da chuva,era liso e sem nome.

A curiosidade imediatamente dominou-me por completo, quem poderia ser tão pretencioso a ponto de deixar-me uma carta sem se identifcar? e o que pretendia com isso? me assustar?, em menos de 1 minuto minha mente foi oprimida por milhares de perguntas sem resposta.Decidi então pegar o envelope. Era uma citação, dizia apenas: "O Essencial da arte é exprimir; o que se exprime não interessa" [Fernando Pessoa].

(continua)

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Nostalgia poética

Invejo os poetas que, como dom natural possuem o poder de se fazer entender por meio das palavras como seu instrumento. Palavras, as quais traduzem os sentimentos desnorteados que habitam o campo do abstrato, dando-os forma e sentido, admitindo-os com tal naturalidade e praticidade que nos faz acreditar erroniamente que trata-se de um trabalho simplório.

Simplório, se ignorarmos o fato de que aceitar o sentimento é tão árduo quanto reconhece-lo, tendo a consciencia de que há um limite ténue entre dois extremos, principalmente ao tratar do que sentimos, o ódio e o amor, por exemplo são facilmente confundidos.

O processo de reconhecimento do sentimento é complexo simplesmente porque o consciente só expõe o sentimento polido, que passa pelo subjugo da razão e da reflexão humana, esta é guiada pelos estereótipos propostos pela sociedade e pelo ego, deixando no subconsciente o rudimentar, que ainda não foi afetado pela censura.

Os sentimentos e também os pensamentos não são genericamente livres, já que os pensamentos, assim como os sentimentos tendem a passar por uma seleção do consciente por meio de censuras e logo, os sentimentos são regidos pelos pensamentos.

Por fim não é mais possivel ser dono de si mesmo por completo, você é movido a padrões e lições externas que invalidam sua real essência, tendo que cumprir exigências e censuras que você mesmo estipulou,que ironia, para não fugir a realidade em que vive. Torna-se movido a padrões sociais; movido a razão, deixando de agir por impulso, deixando de valorizar o seu rudimentar, a intuição inerente.

Há quem diga que ao nos afastarmos de nossa herança primitiva estamos nos tornando mais civilizados, o que pra muitos retoma a idéia de evolução, mas o que de fato não avaliamos, é a perda não só do instinto como também o ganho de um vazio e mecânico que criamos, não pensamos por nós, não sentimos por nós, adaptamos e apropriamos os sentimentos e pensamentos pré-existentes para nos moldarmos ao padrão.

No entanto, é por esta libertação que invejo os poetas, estes não se apropriam, transformam a matéria bruta sem perder a essência.


















texto e imagem por Tatyana Elia